Transformada Z

Analogamente à transformada de Laplace para funções cujo domínio é contínuo (tempo contínuo), temos, para funções cujo domínio é discreto (tempo discreto), a transformada Z, a qual é definida formalmente do seguinte modo:

Seja uma seqüência
 
{ f(i) } = { f(0 ), f(1), f(2), ...} n (11a)

Então a transformada Z desta "função do tempo discreto" é
 
(13)

onde z  C.

A relação entre a transformada Z e a transformada de Laplace é estabelecida pelo seguinte:

Associemos a cada ponto da seqüência um impulso unitário. Então temos a "função" associada à seqüência:
 
(11b)

Onde  é o intervalo de tempo entre 2 impulsos consecutivos.

Ora, sabemos que

Então, tomando a transformada de Laplace de (11b), vem
 
(12)

Definindo 
 
(13 bis)

Introduzindo a notação

, vem
 
(13 bis)

Observe-se que z pode assumir qualquer valor em C tal que a soma exista. Assim a transformada de Laplace é útil para resolver equações diferenciais, a transformada Z é útil para resolver equações de diferença.

Precisamos saber, portanto, as propriedades principais das transformadas Z.
 

Seja 

1) Seja . Então
 
(13.1)

Ver Prova
 
 

2)
 
(13.2)

Ver Prova
 
 

Observação:

O análogo da propriedade anterior para o tempo contínuo é a integração, i.e., lembra-se que

Portanto um retardo no tempo de uma função do tempo discreto é o análogo de integração de uma função de tempo contínuo.

É de se esperar que o análogo do avanço no tempo de uma função do tempo discreto seja a derivação para função do tempo contínua. Esta expectativa é correta, pois temos:
 
 

3)
 
(13.3)

Observe-se que há uma pequena diferença na analogia com relação ao tempo contínuo: z f(0).

Ver Prova
 
 

Vejamos qual a transformada Z de f(i+2)

Ora, definindo

De um modo geral, temos


 

4) Seja a convolução discreta de duas seqüências definida como
 
(13.4)

Então,
 
(13.5)

Ver Prova
 
 

5) Seja f(i) = 1  inteiro não-negativo (degrau unitário)

Então
 
 
 (13.6)

Ou seja, a transformada Z de um degrau unitário é z/(z-1).
 
 

6) Vejamos a transformada Z de um pulso unitário aplicado na origem, ou seja,
 
 
 (13.7)

Ou seja o resultado é o mesmo da transformada de Laplace de um impulso unitário aplicado na origem
 
 

7) Seja agora um pulso de "duração" N, ou seja,

Trata-se portanto de


 

Ora, como vimos

Por outro lado, vimos que
 
(13.8)

 

8) Seja a "seqüência geométrica", i.e.,

f(i) = ai

(esta seqüência será crescente em módulo se |a|>1 e decrescente em módulo se |a|<1. Se a = 1, temos o "degrau discreto", visto acima. Se a = - 1 temos uma seqüência alternada de 1’s e -1’s.)

Ora,
 
(13.9)

9) Vejamos a "rampa geométrica", i.e.

f(i) = i.ai-1, i = 0, 1, 2, ...

Definamos g(i) = ai

Então, 

Mas vimos em (13.9) que
 
 
(13.10)

 

10) Seja agora a rampa discreta, i.e.,

f(i) = i , i = 0,1, 2, ...

É claro que basta usar (13.10) com a = 1, obtendo
 
(13.11)

Vejamos como resolver equações de diferenças usando transformada Z.

Seja novamente o sistema discreto definido por
 
x(k+1) = A.x(k) + B.u(k)
y(k) = C.x(k)
(3 bis)

Aplicando transformada Z a este sistema de equações, temos, em vista de (13.3)
 
(14)

E portanto,
 
(15)

Se x(0) = 0, temos

Seja
 
(16)

Tal como no caso do tempo contínuo, H(z) é a matriz de transferência do sistema, i.e., é a relação entre as transformadas Z da resposta e do comando com condições iniciais nulas.

Ora, vimos que a transformada Z de um pulso unitário aplicado na origem é 1. Consequentemente, H(z) é a transformada Z da resposta do sistema a um pulso unitário aplicado na origem.

Mas vimos em (10) que a resposta do sistema a um pulso unitário aplicado na origem é
 
H(i) = C.Ai-1.B, i = 1, 2, 3, ... (10 bis)

Então, em vista de (16) e do que foi dito acima,

C.(z.I - A)-1.B = Z[C.Ai-1.B]

Tal como em sistemas de tempo contínuo, as transformações de estado também são muito úteis no estudo dos sistemas de tempo discreto

Seja (i) = Q.x(i)

Com Q não-singular. Substituindo x(i) = Q-1.(i) em
 
x(k+1) = A.x(k) + B.u(k)
y(k) = C.x(k)
(3 bis)

obtemos
 
(i+1) = Q.A.Q-1.(i) + Q.B.u(i)
y(i) = C.Q-1.(i)
(19)

Seja 

É fácil verificar que
 
i := Q.Ai.Q-1 (20)

Consequentemente
 
(20a)

Ou seja, a resposta ao pulso aplicado na origem (i.e. em k=0) é invariante sob transformação de estado, tal como em sistemas de tempo contínuo. E o mesmo acontece, é claro, com a matriz de transferência.

Seja o sistema (3) com u(i) = 0 

x(i + 1) = A.x(i)

Dizemos que o sistema é assintoticamente estável (AE) se
 
(21)

Trata-se, portanto da mesma definição que a dos sistemas de tempo contínuo.

É evidente que a estabilidade assintótica é invariante sob transf. de estado, i.e., (3) é AE se só se (19) também o for. Com efeito, de  = Q.x e x = Q-1.  temos .

Suponhamos que a matriz A do sistema seja diagonalizável (o que ocorre se só se os seus vetores próprios forem l.i.). Seja Q-1 a matriz formada com os auto-vetores de A. Seja a transf. de estado  = Q.x .Então, com u = 0, vem x(i+1) = A.x(i), onde
 
(22)

Ora, de (7) vimos que a solução de (22) é
 
(23)

onde (0) := o

Seja 
 
(23)

Disto é fácil concluir que:
 
 

Teorema:

O sistema (22) (e, portanto, o sistema (3) é AE se e somente se
 
(24)

Ver Prova
 
 

Então, acabamos de provar que para sistemas de tempo discreto, a parte "boa" do plano complexo é o interior do círculo unitário. Assim, o sistema é AE se, e somente se, todos os seus autovalores estiverem no interior do círculo unitário.

A parte "ruim" do plano complexo é o complemento do interior do círculo unitário.
 



 


O sistema que tem os pólos acima é AE. Se algum pólo estivesse sobre ou do lado de fora do círculo unitário, o sistema não seria AE.

Consequentemente, o interior do círculo unitário, para sistemas de tempo discreto, faz às vezes do semi-plano aberto da esquerda para sistemas de tempo contínuo. O complemento do interior do círculo unitário, para sistemas de tempo discreto, faz às vezes do semi-plano fechado da direita para sistemas de tempo contínuo.

Segue um exemplo

Seja  = interior do círculo unitário e  := seu complemento.

Será que existe um mapeamento de  para  e de  para ? A resposta, afirmativa, é dada pelo seguinte:
 
 

Lema:

A função   mapeia   em e mapeia  em .
 

Observação:

Esta transformação  é chamada transformação de Möbius.

Ver Prova

A transformação de Möbius é importante para analisar a estabilidade de um sistema através do critério de Hurwitz. Com efeito, dado o polinômio característico de um sistema de tempo discreto, para verificar se seus zeros estão todos no interior do círculo unitário, aplique-se a transformação de Möbius e verifique-se se no polinômio resultante temos todos os zeros em .

Vamos agora falar em controlabilidade e observabilidade de sistemas discretos.

Começaremos com a controlabilidade. Lembra-se que, para sistemas de tempo contínuo, um sistema é controlável se existir um controle que transfira em tempo finito um estado inicial (arbitrário) para a origem. Vimos, também, que o sistema é alcançável se existir um controle que transfira em tempo finito o estado da origem para um estado final arbitrário.

As definições são as mesmas para sistemas de tempo discreto, mas, como veremos adiante, as condições não são equivalentes. O resultado seguinte, entretanto apresenta como condição para controlabilidade e alcançabilidade a mesma condição para os sistemas de tempo contínuo.
 
 

Teorema 3:

Dados x0 e x1, arbitrários, existe um controle {u(i)} que transfere o estado do sistema de x(0)=x0 para x(n) = x1, se, e somente se, a matriz de controlabilidade.
 
(26)

tiver posto n

Neste caso o sistema é dito controlável e alcançável.

Um controle { u(i) } que faz a transferência de x0 a x1 em n passos é
 
(27)

Observação:

n é a dimensão de A. Se o sistema é controlável e alcançável, pode-se fazer a transferência de estado de x0 para x1 num número de passos maior ou igual a n. Não há garantia que o sistema possa ser transferido em no de passos menor que n. (Isto será possível, eventualmente, dependendo de x0 e x1).

Ver Prova
 
 

Observações:

É claro que (30) também tem solução se aumentarmos a matriz à esquerda até AkB, com k > n-1. Por outro lado, vimos também que se B tiver posto cheio, então

Posto [ PC ] = Posto [ B, A B, … , An-m B ].

Então, se m > 1 e Posto B = m, pode-se transferir o sistema de x0 e x1 (arbitrários) em (n-m+1) passos.

Os testes PBH valem também, é claro, para sistemas de tempo discreto. O mais importante é o teste do posto, que repetimos aqui.
 
 

Lema (teste do posto PBH):

O sistema x(i+1) = A x (i) + B u(i) é controlável e alcançável se, e somente se,

Posto [z I – A | B] = n  .

Como já foi observado, este teste permite muitas vezes, principalmente quando A e B têm muitos zeros, uma verificação rápida, por simples inspeção.

Vejamos agora a observabilidade:
 
 

Teorema 4:

Seja o sistema (3) com controle nulo. Se o estado for desconhecido, ele pode ser determinado por meio de {y(0),...,y(n-1)} se, e somente se, a matriz de observabilidade:
 
(31)

tiver posto cheio (n). Neste caso o sistema é dito observável e reconstruível e o seu estado pode ser determinado por
 
 
(32)
 
 
 
 

(33)

Observações:

As mesmas feitas a respeito da controlabilidade, i.e.,

Se Posto [C] = p não é preciso ir até C.An-1, etc.

Se u(i)  0 , então, ao invés de y(1), y(2), ..., y(n-1) em (32), devemos usar, em vista de (8) da seção 13.2.

y(1) – C B u(0), y(2) – C A B u(0), ….,

, respectivamente,

Ver Prova
 
 

Analogamente, ao caso de tempo contínuo, temos também para sistemas de tempo discreto:
 
 

Lema (Teste PHB do posto):

O sistema de tempo discreto x(i+1) = A x(i), y(i) = C x(i) é observável e reconstruível se, e somente se,

Vários resultados do capítulo 10 sobre controlabilidade e observabilidade se aplicam aqui. Assim, controlabilidade e observabilidade de sistemas discretos são evidentemente propriedades duais. Valem também é claro, para sistemas discretos a invariância da controlabilidade e da observabilidade sob transformação de estado. As formas canônicas controlável e observável são, evidentemente, as mesmas. Idêntica também a decomposição canônica em sub-sistemas controlável, não-controlável, observável, não-observável e suas combinações.

Mas há uma diferença importante entre sistemas de tempo discreto e contínuo e que é a seguinte: enquanto nos sistemas de tempo contínuo com parâmetros ctes. controlabilidade e alcançabilidade são perfeitamente equivalentes (i.e. o sistema é controlável se só se for alcançável), isto não é verdade nos tempos de tempo discreto. Com efeito, de (29) temos

Se An = 0 então x(n) = 0 com u(n-1) = ... = u(1) = u(0) = 0, qq. que seja x(0) e qq. que seja Posto [Pc].

Consequentemente Posto [Pc] = n não é condição necessária para a controlabilidade, se A for nilpotente.

Mas por outro lado, com x(0) = 0, temos

Então, se x(n) for escolhido arbitrariamente a equação acima tem solução para o controle se só se Posto [Pc] = n. Portanto Posto[Pc] = n é condição necessária (e suficiente) para a alcançabilidade. Consequentemente controlabilidade e alcançabilidade não são equivalentes em sistemas de tempo discreto.

Tal como nos sistemas de tempo contínuo, podemos realimentar os sistemas de tempo discreto com a resposta (u(i) = Ly(i) + v(i)) ou com o estado (u(i) = Kx(i) + v(i)).

Com realimentação de estado podemos posicionar arbitrariamente todos os pólos do SMF caso o sistema seja alcançável. Um caso particular interessante de realimentação de estado é aquele em que posicionamos todos os pólos do sistema na origem:

(A + B.K) = {0, 0, ...,0}

A equação com realimentação de estado é

x(i+1) = (A + BK) x(i) +Bv(i) , i=0, 1, 2, …

Com v(i) = 0, i=0, 1, 2,…, vem

x(i+1) = (A + BK) x(i) , i=0, 1, 2, …

cuja solução, como sabemos, é
 
x(i) = (A + BK)i x(0)  (38)

Ora, se todos os pólos do sistema (auto-valores de A + BK) estão na origem, a equação característica do sistema é

n = 0

Mas de acordo com o teorema de Caley-Hamilton, toda matriz satisfaz à sua equação característica. Então,

(A + BK)n = 0

Disto e de (38), vem
 
x(i) = 0, n (39)

Então, qq. que seja o estado inicial, o estado do sistema vai a zero em (no máximo) n passos. Tal controle (que leva os a.v.’s do sistema para a origem) é chamado "deadbeat controle".

Tal como em sistema de tempo contínuo, podemos construir observadores (de ordem cheia e de ordem reduzida) para sistemas de tempo discreto. Colocando os pólos do observador na origem por meio de "ganho" conveniente, i.e., escolhendo a matriz L (no caso do observador de ordem n) tal que todos os pólos de A + LC estejam na origem, obtém-se o chamado observador "deadbeat": neste caso o estado estimado iguala o estado do sistema em (no máximo) n passos. Se for usado observador de ordem reduzida, o sub-estado iguala o sub-estado do sistema em (no máximo) n-p passos.