Como mirar o futuro sem se voltar para o passado? Como criar possibilidades sem o exercício da imaginação? Pensar a deterioração da qualidade de vida nas cidades implica olhar pra trás para poder mirar à frente. Se as cidades se constroem de forma cada vez mais segregada, é fundamental encontrar os caminhos alternativos que foram abandonados nesse processo. No Rio de Janeiro, a literatura, urbana por excelência, de João do Rio nos permite um olhar para os caminhos da cidade e os trajetos alternativos abandonados no percurso. Escrevendo no início do século XX, em uma cidade que começava a transcrever em seu desenho urbano divisões que já se marcavam na sociedade, João do Rio se destacou pelo seu apurado olhar para a cidade e as relações que nela se estabeleciam e, principalmente, pela forma que soube traduzir em texto essas relações. Em uma análise da vida e da obra do autor, o trabalho busca apresentar um encadeamento entre o rumo de suas publicações literárias e o avanço do aprofundamento das divisões urbanísticas na cidade do Rio de Janeiro, assim como da construção da imagem de João do Rio enquanto intelectual carioca. Em uma investigação que se pretende simultaneamente biográfica, bibliográfica e urbanística, o trabalho parte da identificação dos temas debatidos nos primeiros textos do autor como um mapeamento de caminhos possíveis para a cidade que já começavam a ser sufocados pelo avanço da República, para seguir para a compreensão de seus textos posteriores como uma anuência ao poder das classes dominantes, seus habitus e seu estilo de vida, mas, principalmente, sua proposta de cidade – uma cujo desenvolvimento levou à crise contemporânea. O mapeamento dos futuros que não foram, apresentados à leitura contemporânea por João do Rio, oferece caminhos para pensar futuros possíveis que recuperem essa história da cidade abafada pelo avanço implacável das forças de "ordem e progresso" ao longo do século XX, fio condutor do trabalho a ser apresentado.