A IDENTIDADE DO CAMPO EDUCACIONAL: uma tensão entre modernidade e pós-modernidade?
Vera Henriques (PUC-Rio)
Introdução

        Inúmeras e variadas são as questões possíveis a serem colocadas quando se busca entender a especificidade do campo educacional. Todavia, embora sob ângulos diferentes, tais questões se definem sempre em referência ao aspecto plural de formação do campo e ao seu modo de atuação frente à realidade. Desta feita, questiona-se: é o campo educacional uma forma de conhecimento com estatuto científico? A que demanda ele corresponde; social, epistemológica ou profissional? Seu objeto está ligado a temas e problemas, e deve portanto forjar uma metodologia de acordo com eles? Faz uso de métodos particulares ou pede emprestado aos outros campos do conhecimento? O campo educacional demanda a outros campos uma prática interdisciplinar? As respostas, na maior parte das vezes são excludentes, expressando ora tentativas de explicações epistemológicas ora fundamentações de caráter prático (CHARLOT, 1995).

        Todavia, dentro de uma proposta de análise que privilegia a perspectiva teórico-metodológica de Bourdieu (1992) é possível pensar o campo educacional superando essa oposição teoria / prática e entendê-lo tal como os demais campos do espaço social, definindo-se e funcionando de forma relacional. Do ponto de vista interno, enfatiza esse autor, os atores inseridos em um campo, constroem e se ajustam a uma lógica particular, através de alianças, lutas e conflitos, num confronto de posições e relações estabelecidas no e pelo contínuo jogo, onde estratégias de conservação ou de transformação são estabelecidas. Externamente, a definição de um campo é inseparável das relações que ele mantém com os outros campos, tendo sempre como limite as condições objetivas, conjunturais e estruturais existentes. Nesse sentido, o campo não é nem detentor de uma autonomia absoluta, nem possui a dimensão exterior como condição necessária de sua produção. A relação entre ambas o constituem como campo. Portanto, se a condição de campo é relacional e histórica, se torna possível tentar entender sua identidade não de forma estática e definitiva, mas partindo das articulações que em um determinado momento do tempo o campo estrutura em seu interior, em conjugação com os outros campos e com o espaço social. A identidade de um campo teria então, a dimensão de seu funcionamento, representada pelo alcance da relação dialética entre o que lhe é colocado e a forma como ele se articula.

        Desta feita, qualquer tentativa de pensar a identidade do campo educacional tende a passar por uma dupla leitura cujas dimensões, inseparáveis, definem a gênese, a estrutura e a atividade do campo. Pois, se enquanto movimento interno é possível ver esse campo estabelecendo-se nas ações e reações dos agentes lutando para manter ou melhorar suas posições, a partir do volume de capital específico que possuem, essas são também tomadas de posição e estratégias que visam definir o campo externamente em consonância aos paradigmas científicos existentes. Levando em consideração essa aparente duplicidade, por acreditar que ela é fundamental para entender a identidade do campo educacional, nos perguntamos: a forma de produção e de articulação de conhecimento ali desenvolvidas, podem ser definidas externamente a partir da tensão que se estabelece através do debate moderno x pós-moderno ? Visto ser essa uma discussão pertinente dentro do meio acadêmico-científico de hoje, vamos tentar equacioná-la.

O debate moderno x pós-moderno e a educação.

        Sem discutir a natureza e a profundidade das transformações que desde o início do século XX têm alterado o jogo sócio-cultural, político econômico na sociedade ocidental, aceitamos a existência de aspectos que se impuseram sob o crivo de padrões diferentes daqueles considerados modernos. Sim, pois ainda que o próprio termo pós-modernidade seja ponto de discussão, existem mudanças.

        D. Harvey (1993), no desdobramento de suas dúvidas a respeito das propostas e do lugar do discurso pós-modernista define pontos centrais. Vê-se, afirma ele, que o discurso pós-moderno defende o efêmero, o fragmento, a descontinuidade como princípios básicos da existência humana. Não tenta legitimar-se pela referência ao passado, mas, ao contrário, enfatiza o profundo caos da vida moderna e ali a impossibilidade de lidar com o pensamento racional, Condenando as verdades eternas e universais, legitima o pluralismo e a autenticidade de todas as vozes. Nesse sentido, torna impossível qualquer aspiração de representação unificada do mundo, ou qualquer projeto global.

        Outro autor de expressiva significação para o debate é Rouanet (1993), por pensar não somente a mudança, mas as formas de sua expressão. Ele reconhece que, se partirmos da perspectiva polissêmica que expressa um grande número de pessoas aplicando o termo pós-modernidade aos mais variados campos (arquitetura, literatura, pintura, cultura, ciência, filosofia, economia, política, etc) e sob óticas excludentes (fuga para o passado ou nova vanguarda), temos que reconhecer que entramos em uma nova era e que a modernidade envelheceu. Todavia, a formulação de Rouanet segue no sentido de questionar a própria indefinição do termo, vendo-a mais como reflexo de um estado de espírito do que a expressão de uma realidade já cristalizada. A consciência de ruptura não significa para esse autor, necessariamente a correspondência com uma ruptura real.

        No campo educacional, salienta Giroux (1993), a questão da pós-modernidade ainda é vista com reticências, uma vez que teoria e prática educacionais estão estreitamente ligadas à linguagem e aos pressupostos do modernismo. Mas, contrariando esse autor e colocando-nos sob uma ótica relacional, acreditamos ser possível não fechar esse campo em classificações “puras” e excludentes. Então, ao invés de defini-lo apenas sob o ângulo da modernidade preferimos admitir que, pela forma particular de sua gênese e de sua produção ele se insere na atual tensão paradigmática decorrente da existência de dois modelos de racionalidade do cenário acadêmico: a moderna e a pós-moderna. O reconhecimento da existência dessa tensão deve-se em parte às modificações que atualmente vivenciamos no campo científico. Mudanças referentes à conscientização da interdependência das diferentes áreas do conhecimento, à interlocução prática com os campos vizinhos e à provisoriedade das formulações científicas (Brandão, 1992). Assim, no interior do campo educacional se torna possível identificar dois pontos, entendidos como instrumentos de análise para pensar a inclusão desse campo no debate definidor da tensão: a questão da dimensão não-disciplinar do campo e a discussão a respeito da definição do termo ciências da educação.

        Dependentes e articuladas entre si, quando definidas relacionalmente, essas questões assumem uma dupla dimensão: são simultaneamente elementos da gênese do campo educacional, e questões históricas, visto que a pós-modernidade repensa e põe em cheque o disciplinar ao qual estão remetidas e de certa forma também ultrapassam. Expressam assim, a proposta de Bourdieu (1990) ao afirmar que um campo é o resultado da luta travada na dialética entre as dimensões internas e externas. Assim, a redefinição da noção de disciplina vinda de fora, coloca para o campo educacional a necessidade da auto-reflexão que é tanto a tentativa de busca de sua identidade, quanto de participação ativa no meio científico. Por outro lado, a problemática interna referente ao fato de possuir uma constituição multidisciplinar ultrapassa as fronteiras do campo educacional, inserindo-o externamente na discussão histórico-epistemológica da atualidade.

A relação disciplinar / não-disciplinar como forma de ser do campo educacional

        O desdobramento do debate modernidade x pós-modernidade para o campo de produção do conhecimento assume hoje, dentre outras, a característica de flexibilização das fronteiras, complexificando qualquer tentativa de delimitação do conhecimento (BRANDÃO, 1992). Nesse contexto, não somente o termo disciplinar é posto em discussão, como também a viabilidade de uma postura não-disciplinar assumida durante o processo de trabalho científico de pesquisa, entendida como prática interdisciplinar. A proposta de Dogan (1991), segue no sentido de identificar a noção de interdisciplinaridade como enganosa (“uma pobre estratégia de busca”), para defender uma “hibridação científica”. Tal postura implica substituir o critério da colaboração interdisciplinar pelo de interseção disciplinar. Através deste, a especialização disciplinar adquire destaque e importância como centro de interesse. Mas, reconhecer a especialização, significa também estabelecer novas bases de colaboração. Pois, se a unidisciplinaridade parece ser inevitável para Dogan como processo de pesquisa uma vez que a formação de base pressupõe a especialização, existe o momento seguinte que é o alargamento dos horizontes em direção às disciplinas imediatamente vizinhas.

        Jamati (1992), nos diz que a questão da unidade / multiplicidade não é nova, remontando mesmo ao século passado. Desta feita, segundo ela, falar hoje, de disciplinaridade significa tocar em uma das chaves-mestra da discussão que permeia a organização do trabalho científico em seus níveis teórico e/ou prático. Todavia, reconhecemos que torna-se cada vez mais difícil uma reflexão sobre o tema, visto existirem diferentes formas de abordagem, onde os vários termos correlatos são utilizados sem que se chegue a um consenso. Fala-se de transdisciplinar, intradisciplinar, pluridisciplinar, multidisciplinar, em um rico e complexo esforço de se tentar definir ou conceituar a perspectiva não-disciplinar.

        Dentre as diversas versões a respeito da relação disciplinar / não-disciplinar produzidas no interior do campo educacional brasileiro, posso mapear três, que, pela relevância teórica integram atualmente o leque das análises. Primeiramente, uma via didática que procura abordar as implicações da adoção do princípio de interdisciplinaridade na reforma e reorganização da estrutura de pesquisa e ensino (MACHADO, 1993; SANTOS, 1992). Uma segunda, que chamo de epistemológica, interroga a natureza e a especificidade do conhecimento produzido nas várias áreas disciplinares e a relação entre eles (FRIGOTTO, 1993; BRANDÃO, 1993; SEVERINO, 1991). E uma terceira, sociológica, que recorta a questão a partir da relação e/ou inserção dos fenômenos educacionais no seio dos mecanismos sociais humanos (SOARES, 1991; REIS, 1991).

        Restringindo o leque de posições àquelas que de formas diferentes reconhecem a formação multidisciplinar do campo educacional aliada à possíveis práticas não-disciplinares, admitimos no campo a existência de uma luta teórica interna que passa pela própria definição do campo. Nesse sentido, é então possível pensar o campo educacional enquanto campo científico através do exercício de produção de seus agentes. As lutas teóricas, as estratégias e as formas de ação que ali se estabelecem, vistas simultaneamente como expressão de afirmação de um capital específico do campo em relação aos demais campos e ao espaço social como um todo, numa tentativa de definição do status científico desse campo.

        Após um breve levantamento de algumas articulações teóricas presentes no campo educacional a respeito da relação disciplinar / não-disciplinar no campo, é possível perceber que, longe de fazerem um discurso apressado e excludente de qualquer um dos dois paradigmas (moderno e pós-moderno), os produtores do campo preferem a cautela. Mas, quando eles insistem em não abrir mão da disciplina e ao mesmo tempo reconhecem a particularidade da formação e da necessidade de atuação não-disciplinar no campo educacional, estão certamente assumindo a tensão entre modernidade e pós-modernidade como um dos marcos definidores da atual identidade do campo.

        Pois, se a formação multidisciplinar do campo exclui por princípio sua inserção no reducionista paradigma científico da modernidade, pela flexibilidade advinda da multiplicidade dessas forças disciplinares em jogo que assim o constituem como campo, ele se insere na fragmentação dinâmica e mutável da condição pós-moderna. Por outro lado, a tradição pluridisciplinar de constituição do campo educacional afirmada pelo trabalho de investigação que pressupõe problemáticas diversas com características singulares a respeito do objeto educação, viabiliza o exercício por parte dos agentes do campo enquanto pesquisadores, da aceitação de um pensamento e de uma prática não-disciplinar. Tal perspectiva nos leva a pensar também o estatuto e o grau de relação do campo educacional frente à questão das chamadas ciências da educação.

Ciências da educação?

        Plaisance (1993), chama atenção para o fato de que hoje, quando se fala a respeito da identidade do campo educacional, ser possível constatar uma perda de legitimidade do uso no singular (ciência da educação), assim como de expressões tais como pedagogia científica ou pedagogia experimental, que já tiveram seus momentos de glória. A preeminência atualmente está sendo colocada na expressão utilizada no plural - ciências da educação. Nesse sentido, cabe perguntar: o campo educacional constitui uma ciência específica ou é somente um projeto deixando lugar a diversas investigações científicas inscritas nas ciências-mães? Mas, por sua vez também a idéia de ciências da educação, é estigmatizada.

        Até mesmo a nível institucional nos deparamos com a colocação de Fournier afirmando que “ a posição da Faculdade das Ciências da Educação é paradoxal: ela é a menos profissional das faculdades ditas profissionais e a menos científica das faculdades ou departamentos científicos“ (Fournier. sd.). Explicitando o discutido princípio da questão, Mialaret (1969) assume uma postura menos rígida. Segundo ele, a atual substituição do termo pedagogia por ciências da educação corresponde ao desenvolvimento das disciplinas relacionadas à educação enquanto fato positivo dentro da relação.

        Nesse sentido, afirma que não mais é possível falar de um pedagogo e seus conhecimentos rudimentares, pois a formação de um especialista em ciências da educação exige vários anos de estudos e competências variadas. Nesse conjunto, algumas grandes categorias se fazem imprescindíveis. Primeiro as disciplinas reflexivas onde tem destaque a filosofia da educação. Em seguida, as disciplinas que trazem uma perspectiva histórico-temporal como a história da educação e a pedagogia comparada. Existem ainda segundo Mialaret, as chamadas disciplinas fundamentais como a Biologia, a Psicologia e a Sociologia e aquelas que utilizam os métodos e as técnicas destas para analisar as situações educativas.

        Jamati (1992), não somente reconhece como Mialaret a necessidade das ciências da educação, mas também coloca em questão a existência dessa demarcação quando se trata de pesquisa educacional. Uma pesquisa, diz ela, que, mesmo tomando a educação por objeto é conduzida por uma série de perspectivas científicas distintas e onde a aceitação de uma abordagem de um mesmo campo por uma equipe interdisciplinar não significa “sincretismo de resultados”

        Todavia, tão pertinente quanto o fato de existirem em relação às ciências da educação tanto a segregação (Fournier), quanto o reconhecimento pela via da classificação (Mialaret), ou o critério disciplinar tomado como base (Jamati), é a existência do próprio termo ciências da educação que parece trazer consigo particularidades da formação do campo educacional. Por que falar em ciências da educação numa sutil indicação da provável dependência da educação em relação a outros saberes? Se existem ciências da educação, seria a educação um tipo de saber “menor” diante daquelas, e não uma ciência como elas? Então, o que faz com que o campo educacional não possa ter sua autonomia e identidade científica?

        Brandão (1992), afirma que o campo educacional não possui uma tradição enquanto área científica. Aponta dentre outros, para fundamentar sua colocação,o fato de que existe no meio educacional uma “tendência a reproduzir discursos sobre teorias, ao invés de operar criticamente com as referências teóricas”. Isso, segundo a autora, se constitui como obstáculo para a progressão do conhecimento em educação nas mesmas bases daqueles das ciências humanas e sociais. Nesse sentido, fica difícil falar dos “clássicos” e da “tradição” própria do campo.

        O termo ciências da educação, identificado como o conjunto de sistematização específico, formado por disciplinas que falam sobre educação, pode então ser um meio para encobrir uma particularidade na forma de trabalhar dos agentes do campo? A partir daí, percebo que a complexidade da questão relativa à produção de conhecimento no campo educacional pode passar simultaneamente pela discussão dos interesses de seus agentes e pelos contornos que a partir desses interesses são estabelecidos com os campos das ciências humanas e sociais. Interesses que, certamente estão pôr trás, ativando aquelas estratégias que Brandão identificou como a tendência a reproduzir os discursos teóricos de outras áreas de conhecimento, pelos agentes do campo educacional.

        Nesse sentido, duas possibilidades se colocam como viáveis. Primeiro, podemos admitir as ciências da educação como resultantes, da colocação que pressupõe que a pesquisa em educação depende de outras áreas de conhecimento, pela especificidade de seu objeto - educação. Por outro lado, de acordo com Carvalho (1988), vemos que o campo educacional tem assumido novos estatutos dentro do espaço social-humano. Remetido à cultura, ao poder, ele se insurge e se distingue parcialmente em relação às ciências fundamentais, para colocar a elas suas próprias questões, na medida em que os seus interesses agora transcendem os interesses daquelas, não é mais possível falar de ciências no plural, mas de ciência da educação.

        Ao invés de me deter na base epistemológica da discussão a respeito da definição do termo ciências da educação, prefiro tentar construir as bases da questão retomando a noção de campo. Assim, partindo da idéia de que a dialética entre as dimensões interna e externa de um campo definem sua gênese e sua condição, por que não pensar ciências da educação como expressão da tensão que se coloca no campo educacional pela tentativa de definição de uma relação: a dificuldade que os agentes do campo encontram em conciliar o fato de não poderem abandonar a dimensão particular de seu objeto e simultaneamente conhecerem as suas possíveis formas de tratamento, definidas externamente pelas condições objetivas e onde entram também em questão outras formas de conhecimento? Poderá então a identidade do campo educacional enquanto campo de produção de conhecimento, ser definida a partir de sua particular estrutura de formação e de distribuição de diferentes espécies de capital? (BOURDIEU, 1984).

        Uma tensão onde a presença e a defesa do particular (pedagógico) como forma específica do interesse do campo é ativado através das jogadas dos agentes, entendidas como estratégias de conservação, segundo a posição ocupada no jogo e pela trajetória de cada um, mas onde simultaneamente aqueles que no campo detém também outras formas de capital tendem a definir o jogo a partir delas. Nesse sentido, seriam estabelecidas formas de luta concorrencial entre os agentes dentro do campo, tanto pela disputa do capital pedagógico tido como próprio do campo, quanto pelo conflito que se impõe entre ele e as possíveis formas de capital que a partir dele podem ali ser ativadas.

Reflexões finais

        Plaisance As colocações aqui estabelecidas na tentativa de pensar a identidade do campo educacional tendo por referência a proposta desenvolvida por Bourdieu em relação à noção de campo, certamente ajudam a pensar sob novo ângulo questões que não são novas. Isso significa, pensar a área educacional como um campo de produção de conhecimento, construindo-se a partir de parâmetros relacionais e definindo sua produção como o jogo estabelecido entre os agentes dentro do campo, em relação aos outros campos e às condições objetivas externas. Mas, essa produção é inseparável daquilo que no campo se toma por objeto.

        Plaisance Pensando o que Charlot (1995) estabelece como ciências da educação em relação ao que aqui construí como campo educacional, é possível afirmar que esse campo produz conhecimentos específicos sobre práticas que são, por natureza pluridimensionais e contextualizadas. Práticas que, ao mesmo tempo em que trabalham fenômenos cognitivos, sociais, etc são sensíveis às diferenças entre as situações e às variações entre essas situações. E, por serem complexas, se torna impossível compreender tais práticas com o recurso de parâmetros estritamente pedagógicos.

        Plaisance Assim, definindo-se através da produção sobre práticas de caráter pluridimensional, o jogo no campo educacional assume no interior desse campo uma relação de poder entre as diferentes formas de capital demandadas pela dimensão múltipla do objeto em questão (práticas pluridimensionais e contextualizadas) tornando a produção irredutível à dimensão disciplinar. Em consonância a isso, cada situação de produção de saber deve ser entendida como uma situação específica, mas em relação às outras. Participam, portanto do jogo no campo educacional jogador com diferentes volumes e espécies do capital exigido e ocupando diferentes posições dentro do campo.

        Plaisance A luta tende assim a se estabelecer como luta concorrencial a partir de disputas em torno da relação entre o capital tido como específico e as diversas formas desse capital ali presentes. São posições de força que subtendem e orientam as estratégias pelas quais os ocupantes dessas posições procuram individual ou coletivamente manter ou melhorar sua posição e impor o princípio de hierarquização o mais favorável a seus próprios lucros. O disciplinar, demandado pelas diversas situações é, portanto a base da atividade pluridisciplinar do campo educacional como um todo, mas não é apenas através dele que se captam práticas pluridimensionais. Nesse caso, o não-disciplinar se impõe junto com o disciplinar enquanto princípios estruturantes e estruturados dentro do campo, definindo através da luta concorrencial, uma possível identidade do campo educacional.






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